Software Livre na Reforma Universitária
Software Livre (SL) é aquele que dá as seguintes liberdades para o usuário:
- Executá-lo para qualquer fim (educacional, comercial, lazer);
- Reproduzi-lo à vontade em qualquer mídia e instalá-lo em qualquer computador;
- Alterar o programa para adaptá-lo a necessidades específicas, fazer melhorias e correção de defeitos;
- Distribuir o resultado disso para todos.
A liberdade de alteração por parte do próprio usuário é possível através do código-fonte do programa que deve vir junto com o mesmo. O Código-fonte é formado pelo(s) arquivo(s) com as instruções que dizem o que o programa deve fazer em cada situação, que cálculos realizar, o que exibir na tela, o que mandar para a rede e de que forma. Nos primórdios da informática os programas eram livres, sendo comum o compartilhamento de código-fonte entre os programadores; até alguns enxergarem a possibilidade de ganhar dinheiro produzindo-os. O espírito de cooperação deu lugar ao medo de se revelar segredos industriais.
Se alguém resolve desenvolver software e declará-lo livre, ele sempre o será, bem como as alterações derivadas. Ninguém pode se apoderar dele. Empresas podem ter em seus quadros desenvolvedores de SL (há algumas com interesse nisso, mesmo nas condições dadas), mas o resultado fica com a comunidade, com a Humanidade, não passa a ter partes proprietárias por causa disso.
Em que isso tudo implica? Software proprietário é uma caixa preta. Não há como saber se ele possui ou não algum 'código maldoso', se está mandando algum dado confidencial para algum lugar não autorizado ou se possui brechas que permitem que pessoas mal-intencionadas causem prejuízos. Em laboratórios e centros de pesquisa, nunca será possível saber, em sistemas de código fechado, se as informações ali presentes estão sendo enviadas para o fabricante ou desenvolvedor do software. Por esse, e por outros motivos, o famoso projeto GENOMA é todo baseado em SL.
Quem escreve algo pode cometer erros devido a vícios e condicionamento. No caso do SL um problema que passa despercebido pelo desenvolvedor em Marília fica claro aos olhos de outro que está na Jamaica, que passou por outras experiências e vê as coisas de outro jeito. Há milhares de pessoas literalmente de olho nos SL's em busca de defeitos para corrigir. Houve casos de programas importantes usados nos servidores que mantêm o funcionamento da Internet em que uma falha de segurança foi achada e corrigida em 4 horas! Já ouve casos de sistemas de controle acadêmico possuirem brechas de segurança e essas demorarem meses para serem corrigidas, simplesmente por causa da burocracia entre a universidade e a empresa fornecedora.
Com SL cobra-se menos pelo produto e abre-se espaço para geração de renda através de prestação de serviços, de forma descentralizada e autômoma. Seu modelo de desenvolvimento e uso também inibe concentração de renda por parte das empresas de software proprietário e cria mais empregos na área. No aspecto financeiro, a não exigência de pagamento de licenças cria um potencial de economia de dinheiro considerável e ganho de eficiência para órgãos públicos, que precisam ser responsáveis com o dinheiro do povo; empresas privadas, projetos sociais e organizações sem fins lucrativos.
E o que a Reforma do Ensino Superior tem a ver com isso?
As Universidades brasileiras gastam verdadeiras fortunas em convênios aparentemente atraentes, pagando licensas individuais para pacotes da Microsoft e de outros fabricantes. Todo esse custo pode ir a zero, com a adoção de alternativas livres como o OpenOffice.org. A maioria das necessidades dos laboratórios de informática da graduação, os chamados LIGs, pode ser 100% suprida por alternativas livres. E quando falamos em alternativas livres, não excluimos a possibilidade(embora não seja a melhor, mas pode ser um primeiro passo) de o Windows ser o sistema operacional. Porém, além dele, todos os demais softwares instalados no computador serão livres.
Além disso, características técnicas dos servidores livres possibilitam uma administração de grandes laboratórios muito mais simples, mais dinâmica e menos trabalhosa, o que ajuda a diminuir o problema(que não pode ser esquecido) da falta de corpo técnico-administrativo nas universidades públicas. No Fórum Social Mundial um exemplo disso pode ser visto. Na Sala de impresa, que continha 120 computadores, todos com Linux, um único comando instala um recurso em todas as máquinas simultâneamente, sem a necessidade de reiniciá-las. Aliás, não houve necessidade de reiniciar nenhuma máquina, nos 5 dias de Fórum.
O que propomos é um processo de migração obrigatório, previsto em lei, que institua um prazo de 2 a 3 anos para as universidades federais migrarem por completo para software livre, dos servidores aos laboratórios. Naturalmente, a lei estaria prevendo que, não havendo alternativa livre satisfatória, a universidade poderá investir em softwares proprietários específicos. Porém, a universidade receberá benefícios se decidir desenvolver uma solução própria e compartilhá-la com o resto do meio acadêmico.
Pararelo a isso, o Ministério de Ciência e Tecnologia, em parceria com o MEC deverá estar instituindo programas de treinamento gratuitos para alunos, funcionários e servidores nas universidades(nos níveis de usuário e administrador) e também, neste primeiro momento, a aquisição do 'Micro Livre'. Um computador instalado 'a mais', em cada LIG, de cada curso, que deverá conter exclusivamente SL. Será o cartão de visita para os cursos que nunca tiveram contato com o Linux e seus derivados.
O Ministério da Educação também deverá implementar em paralelo um projeto já em andamento proposto pela Executiva Nacional dos Estudantes de Computação, o Currículo Livre. Este projeto prevê o mapeamento das alternativas de SL para os softwares específicos utilizados em cada disciplina da graduação e pós-graduação, bem como projetos de desenvolvimento de soluções livres, para os softwares sem alternativas livres disponíveis.
O que ressaltamos é que as decisões relativas a Tecnologia da Informação são de cunho estratégico nas universidades, assim como nas empresas, e por esse motivo, não estamos aqui tratando de um ponto específico para ser incluído em uma lei muito mais global, como a Lei Organânica do Ensino Superior. Trata-se de uma decisão estratégica que irá interferir diretamente nos rumos de todos os setores da universidade, bem como na vida acadêmica dos alunos, professores e funcionários.
Felizmente o Brasil está aos poucos se tornando referência mundial no assunto, devido à disposição do Governo Federal de migrar para SL e permitir que o contribuinte entregue sua declaração de IR sem ser obrigado a usar softwares caros e inseguros. O governo do RS e algumas prefeituras municipais brasileiras, como o exemplo mundialmente conhecido de Rio das Ostras/RJ, escolheram esse caminho e já estão colhendo os frutos. Economizam dezenas de milhões de Reais (que considerando a predominância de empresas estrangeiras no fornecimento de software proprietário ajuda no superávit da balança comercial) que podem ser redirecionados para outros investimentos. Ao incluir este ponto na lei, o MEC não só estará contribuindo para a universidade pública, como estará em consonância com as ações já tomadas por este governo, desde a sua implantação.
ENEC . Executiva Nacional dos Estudantes de Computação "Em Defesa da Universidade Pública, Gratuita, de Qualidade, Para Todos e com Uso de Software Livre"
Leandro Chemalle . Conselheiro do CEPE . UFSCar . dj@polvo.ufscar.br
Francisco José Alves - Mestrado em Engenharia Mecânica . EESC-USP
São Carlos, 18 de feveiro de 2005
Mike Gabriel - 25 Feb 2005